A Via Láctea: nosso bairro no Universo


Indice
O quê é uma galáxia?
Estrelas
Gás
Distribuição da matéria
Galaxias de Núcleo Activo (AGN)
A Via Láctea

Na escuridão do céu noturno numa lua nova, uma faixa esbranquiçada cortada por manchas escuras, atravessa a abóbada profunda cheia de estrelas. Os gregos a chamaram Galáxias (γαλαξίας) e acreditavam que era o leite de Hera derramado no céu para chegar a Héracles filho do deus Zeus e a princesa Alcmena, neta de Perseu. Todas as culturas criaram mitos em torno dessa faixa iluminada que hoje chamamos Via Láctea, tradução literal da palavra grega.
Uma foto 360° do sítio do telescópio VLT (ESO) em Paranal, Chile. A direita dos 5 prédios se vê a faixa leitosa entremeada de manchas escuras: a Via Láctea. (Wikimedia Commons)
Aristóteles diz que Anaxágoras e Demócrito propuseram que a Via Láctea é composta por um grande número de estrelas indistinguiveis que formam a faixa leitosa. Provavelmente foi Galileu Galilei, o primeiro a observá-la com um telescópio, quem comprovou a teoria dos filósofos gregos. Com o aumento da potência dos instrumentos descobriram-se nebulosas espirais que assemelhavam à Via Láctea, e que o astrônomo norte-americano Heber Curtis chamou de universos ilhas. Durante um debate muito lembrado enfrentaram-se a princípios do século XX os astrônomos que pensavam que os universos ilhas de Curtis eram objetos externos da Galáxia, com aqueles que acreditavam que fazem parte da mesma. Foi Edwin Hubble quem finalmente encerrou a discusão ao calibrar a distância a algumas destas nebulosas, encontrando valores de milhões de anos luz, incompatíveis com o tamanho de nossa galáxia.

Estando imersos na Via Lactea, como dentro de um bosque, nos resulta difícil compreender sua estrutura e tamanho. Por isso estudamos outras como a que aparece na imagem abaixo.

Galáxia M81, ou NGC3031, só observada no Hemisfério Norte na constelação da Ursa Maior, uma das primeiras a aparecer nos catálogos e que pode ser observada sem necesidade de telescópio. Fotografia do Hubble Space Telescope (Copyright: Space Telescope Science Institute e NASA)


As galáxias, além de estrelas, são compostas de matéria escura, maiormente gás e pó. A partir do gás formam-se as estrelas e os planetas. Ao longo de sua vida ativa, uma estrela devolve material ao meio onde se formou. Este material encontra-se alterado, e assim as novas estrelas terão uma composição diferente fazendo com que lentamente a galáxia evolua. Sabemos, por exemplo, que elementos mais pesados que o ferro tiveram que se formar nos fornos violentos das supernovas, estrelas que no fim de seu ciclo principal, explodem. O ouro que fascinou desde sempre o homem, se formou em alguma supernova da região onde depois criou-se o Sistema Solar.

Provavelmente as galáxias sejam os primeiros novos objetos estudados após a invenção do telescópio. Algumas podem ser observadas sem aumento, embora resulta difícil distinguir a estrutura que as diferencia. Conhecemos desde tempo imemorial, no entanto, duas galáxias que acompanham as noites do céu austral, chamadas de Nuvens de Magalhães por ter sido o navegante português Fernão de Magalhães quem as descobriu para a cultura europeia, durante sua longa travessia iniciada em 1519. Embora as tenha registrado o astrônomo persa Abd Al-Rahman Al Sufi no ano de 964 e depois Amerigo Vespucci por volta de 1503. As sociedades estabelecidas na América do Sul antes da chegada dos portugueses as conheciam muito bem. Por exemplo, os guaranies chaman Bebedouro da anta e Bebedouro do porco-do-mato à Grande Nuvem e Pequena Nuvem respectivamente. A foto abaixo, tomada por meio de um pequeno telescópio do Observatório Européu Austral (ESO), mostra estas duas pequenas (anãs) galáxias irregulares, as mais próximas da Via Láctea a 175.000 e 200.000 anos luz de distancia. Foi na Grande Nuvem que aconteceu em 1987 a última supernova que pôde ser observada a olho nu.
Fotografia das Nuvens de Magalhães, batizadas de Pequena e Grande (Observatório Européu Austral,ESO).


O qué é uma galáxia?

De forma resumida, as galáxias são uma coleção de estrelas, gás e poeira unidas pela força gravitacional. Devemos incluir também a matéria consistente de objetos frios e sólidos, tais como planetas, asteróides, cometas e planetas menores. Contudo desconhecemos qual é sua proporção sobre a matéria galática total, uma vez que só sabemos o que observamos no sistema solar, onde eles representam menos do 1% da massa (o resto está no Sol). Outros tipos de matéria escura são apenas suspeitos e unicamente podemos especular sobre sua origem e propriedades. As galáxias, por outro lado, tendem a se agrupar. A maioria teria se formado no primeiro bilhão de anos do Universo, que tem hoje cerca de 13,7 bilhões de anos. Ou seja, as galáxias são objetos muito antigos e numerosos, como evidenciado pela fotografia abaixo.
Imagem obtida pelo Hubble Space Telescope de um Campo Profundo no Hemisfério Sul (Hubble Deep Field South, em inglês), onde se vêem milhares de objetos difusos de formas variadas, são as galáxias, muitas delas observadas como eram há 12 bilhões de anos. (Autores: R. Williams do STScI e o grupo HDF-S de NASA.)


Ao observar muitas galáxias a distâncias diferentes, embora tenham quase a mesma idade, estamos observando-as em diferentes momentos da sua evolução. Por exemplo, galáxias do Grupo Local são observadas como eram alguns milhões de anos atrás, enquanto a foto acima mostra um conjunto de galáxias há 12 bilhões. O estudo das galáxias começa com uma classificação baseada na forma, que deu origem a três tipos básicos: (1) elípticas, (2) espirais e (3) irregulares. As galáxias espirais são ainda subclassificadas entre as que têm barra e as que não têm barra no centro. Exemplos dos três tipos principais são exibidos na figura abaixo.

Galáxia elíptica NGC 1132
( STScI e NASA)

Galàxia espiral com barra NGC 1300
( STScI e NASA)

Galáxia irregular 1427A.
( STScI e NASA)


A partir destes tipos
Edwin Hubble criou uma classificação morfológica de galáxias conhecida como diagrama diapasão e mostrado abaixo. Embora a imagem parece mostrar uma evolução temporal de galáxias elípticas para as espirais (o próprio Hubble pensou assim) hoje a evidência observacional contradiz esta hipótese. O esquema, no entanto, continua a ser muito didático, pois permite lembrar todos os tipos facilmente.
Esquema diapasão da classificação de galáxias inventado por Edwin Hubble em 1929. As galáxias espirais com barra são chamadas SB, as que não têm barra simplesmente S, as elípticas E. A subclassificação entre as elípticas (0 a 7) corresponde ao grau de elipticidade. No caso das SB e S, três subtipos básicos são definidos a,b e c que indicam qualitativamente a abertura dos braços. (Fonte Wikipedia, acesso em 02/04/2010).
Galáxias do tipo S0 também são conhecidas como lenticulares. Elas são caracterizadas por um centro elíptico e um disco de estrelas e poeira. A classificação anterior, por outro lado não é completa. Temos ainda as galáxias irregulares, muitas vezes, simbolizadais por Irr. Mais importante, as galáxias peculiares . A peculiaridade pode estar na forma como no caso das galáxias antena, ou na surpreendente emissão do seu núcleo (e, por isso mesmo chamadas de galáxias de núcleo galático ativo ou Active Galactic Nuclei, AGN). No último grupo se destacam os Quasares, cujo nome deriva das palavras Quasi Stelar Object, objeto quase estelar. Os quasares foram descobertos no final dos anos 50 e estão entre os objetos mais distantes que podemos observar. O mistério envolvendo a origem da energia que liberam e as controvérsias sobre a sua distância (ver, por exemplo Quasares, Redshifts and Controversies de H. Arp), os transformou em objetos de culto. Recentemente encontraram uma utilidade inesperada passando a ser um sistema de coordenadas de referência dos satélites GPS. Lembre-se, então, cada vez que pouse em segurança, agradeça a um Quasar.

Estrelas

Os elementos mais conspícuos das galáxias são as estrelas, são também elas as que marcam os caminhos da sua evolução. Portanto, devemos fazer uma pausa para conhecê-las melhor. Vamos ver primeiramente as características de sua luz. As estrelas não emitem a mesma intensidade para todas as cores. Em astrofísica falamos de comprimento de onda, representada com a letra grega lambda (λ), em vez de cor. O comprimento de onda é um conceito mais amplo do que a cor; na verdade, existem vários comprimentos de onda em que não podemos atribuir qualquer cor, porque esta última é definida pelo olho humano, que detecta apenas uma pequena gama de comprimentos de onda.

A luz visível (ao olho humano) tem λ muito pequeno, entre 400 nm (ultra violeta) e 800 nm (infravermelho próximo), algumas pessoas conseguem ver mais, outras menos. A Figura abaixo é um esquema do espectro eletromagnético (luz), variando dos raios-X às ondas de rádio kilometricas. Como pode ser apreciado, a janela visível é muito pequena.
Representação do espectro electromagnético (luz).
Alguém poderia dizer que é melhor observar as estrelas em ondas de rádio porque parece ter mais informações. Mas as estrelas emitem muito pouca energia nesta banda, e assim é difícil observá-las a grandes distâncias. Globalmente, o espectro de uma estrela corresponde ao de um corpo negro , entidade teórica que não tem nada de preto e pode ser muito brilhante. A forma mais detalhada de se estudar uma estrela é por meio de espectros. No entanto, podemos obter informação muito útil se usarmos filtros passa-banda, elementos óticos desenhados para deixar passar a luz em um determinado intervalo do espectro. Usando observações de diferentes filtros pode ser montado uma espécie de espectro segmentado. Entre os muitos esquemas de filtros, o mais famoso é o chamado UBVRI descrito abaixo
SímboloBanda λ   Central [nm]
UUltra Violeta396
BAzul433
VVisível547
RVermelho640
IInfra-vermelho790
Na seguinte figura pode-se ver a resposta dos filtros, quer dizer, como cortam a radiação em função do comprimento de onda.
Resposta dos filtros do sistema UBVRI (Extraido de Introducción a la Astronomia, Prof. Dra. Ana Inés Gómez de Castro, Instituto de Astronomía y Geodesia de Madrid).


A luminosidade de uma estrela se transforma em um número que nós chamamos magnitude. Este número pode ser negativo ou positivo, a coisa mais importante é que é menor para luminosidades maiores, o que a priori parece sem sentido. A razão para isso é histórica como muitas outras decisões em astronomia. A definição precisa da magnitude m é
m = -2,5 log (L/Lo)

onde Lo é uma luminosidade de referência. Se medimos a magnitude de uma estrela usando diferentes filtros, iremos obter valores diferentes para cada um deles, porque o brilho da estrela depende do comprimento de onda, como demonstrado pela lei de Planck. Quando nos referimos à magnitude de uma cor (obtida através de um filtro), usamos o símbolo do filtro diretamente, por exemplo, U = 2,3 e B = 2,6 são as magnitudes de uma estrela no ultravioleta e azul, respectivamente. Uma estrela quente emite mais no UV, sua luminosidade é maior nessa faixa e, portanto, menor a magnitude U que a magnitude do azul B. Em outras palavras, U-B será negativo. O oposto aconteces com as estrelas frias. A diferença de magnitude entre duas cores consecutivas (U-B, B-V, etc) é chamado de índice de cor e é um parâmetro utilizado para classificar uma estrela.

No início do século XX, dois astrônomos elaboraram um dos diagramas mais importantes para compreender a evolução de estrelas usando apenas o índice de cor. Ejnar Hertzsprung (1873 - 1967) astrônomo dinamarquês e Henry Norris Russell (1877 - 1957) de EUA, colocaram em um diagrama o índice de cor no eixo das abscissas e a magnitude absoluta nas ordenadas. Em outras palavras, fizeram um diagrama do brilho em função da temperatura. Um exemplo deste diagrama pode ser visto no seguinte link: Diagrama HR, onde foram utilizadas mais de 20.000 estrelas. A curva mais longa em diagonal da esquerda para a direita é chamada de sequência principal. Uma estrela passa a maior parte de sua vida dentro dela em um único local que não muda com o tempo . Durante este período, a estrela vai consumir todo o hidrogênio disponível no seu núcleo. Quando terminar, inicia a combustão do hélio, e deixa a sequência principal. Estrelas gigantes são aquelas cujo raio é maior do que o de uma da sequência principal à mesma temperatura. Normalmente, as estrelas aumentam de tamanho ao sair da seqüência principal, o que as torna mais brilhantes. O oposto ocorre com anãs brancas , que encolhem tanto que, apesar de serem bastante quentes, o seu brilho é muito fraco. As anãs brancas são também um estágio final de uma estrela que colapsou, encolheu mantendo uma massa similar à do Sol, mas com um raio semelhante ao da Terra.

A evolução de uma estrela pode ser resumida da seguinte forma: a estrela é criada juntamente com muitas outras a partir de uma nuvem de gás e poeira da galáxia. Enquanto colapsa o gás, aumenta a temperatura interna até que começam as reações de fusão. Quando começa a queima do hidrogênio a estrela entra na sequência principal, onde permanecerá a maior parte de sua vida. Ao esgotar o hidrogênio central, dá início a fusão do hélio. A evolução a partir daqui vai depender muito do tipo de estrela podendo aumentar o seu raio (e se tornar uma gigante), colapsar (tornando-se uma anã branca) ou explodir (supernova), deixando como resíduo uma estrela de prótons, ou mesmo um buraco negro. A coisa importante a lembrar aqui é que as estrelas mais quentes, de cor azul, passam por esses estágios muito rapidamente, porque o processo de fusão envolvido (chamado de ciclo CNO) é mais eficiente que o realizado em estrelas frias (chamado ciclo p-p). Uma estrela quente é chamada de jovem, porque a sua vida não excede os 10 milhões de anos. Estrelas frias (como o Sol) podem viver mais de 10 bilhões de anos. As estrelas azuis (jovens, quentes) são as que povoam os céus em abundância, não porque sejam muitas, mas porque o seu brilho é muito intenso. De fato, da nuvem de gás original apenas uma pequena fração é destinada a formá-las. Regiões onde existem estrelas azuis indicam formação estelar recente (milhões de anos); pelo contrário, as regiões povoadas de estrelas gigantes vermelhas parecem mais com cemitérios, onde a dinâmica estelar está em declínio.

Gás

Além de estrelas, as galáxias são formadas por gás e poeira, em conjunto chamados de Meio Interestelar ou simplesmente MI. Por ser o hidrogênio o elemento mais abundante do universo, a sua emissão é mais intensa. O hidrogênio neutro, simbolizado por HI, produz uma linha espectral na freqüência 1.420 MHz, que é a base dos estudos de distribuição de gás em qualquer galáxia. A linha de 1420 MHz é criada pela transição up para down (ou vice-versa) do spin eletrônico do H. Quando é paralelo ao spin do próton, o estado do átomo é um pouco mais energético, enquanto que quando são antiparalelos, é um estado de menor energia. O átomo de HI pode atingir um nível excitado através de um agente externo, e permanecer ali por muito tempo (medido em milhões de anos) porque é um estado metaestável. Quando ele relaxa, emite um fóton na frequência de 1.420 MHz As nuvens de HI têm temperaturas aproximadas de até 100 K e densidades em torno de 100 partículas por cm3. Para uma referência, no nível do mar, a atmosfera da Terra tem 1020 partículas por cm3. Através da observação da linha de 1420 MHz do HI podemos conhecer a velocidade radial do Gás, ou velocidade de aproximação ou recessão, usando o efeito de Doppler. Nuvens de gás podem ser mais frias, nesse caso estarão compostas de gás molecular, com a molécula de hidrogênio, H2 a mais abundante. Estas moléculas emitem quando são excitadas a estados de rotação.

Se houver uma fonte de luz ultravioleta intensa, como estrelas quentes, o hidrogênio pode perder um elétron e se tornar ionizado (também pode ser ionizado por colisões com outros elétrons). Neste caso, o simbolizamos HII ou H+. Nuvens de HII também são chamadas de nebulosas gasosas. Existem diferentes tipos de nebulosas gasosas: (1) Regiões HII (2) Remanescentes Supernovas e (3) nebulosas planetárias. Exemplos dos três tipos são mostrados nas fotos abaixo.

(1) Região HII: Nebulosa de Órion.
( STScI, NASA e ESA)

(2) Remanescente de Supernova: Nebulosa do Caranguejo,
( NASA e ESA, créditos: J. Hester e A. Loll)

(3) Nebulosa Planetária: NGC 2392 esquimo
( STScI e NASA. Créditos para Andrew Fruchter, Sylvia Baggett, Richard Hook e Zoltan Levay)
Nas Regiões HII há uma intensa formação de estrelas com forte emissão de UV, este é o caso da Nebulosa de Órion. A luz UV ioniza o gás em torno da estrela, quando o elétron é recapturado (recombinado) um fóton em frequência mais baixa é emitido, como por exemplo Hα (653,5 nm). As remanescentes de supernova são formadas por nuvens de gás de uma estrela que explodiu misturado com MI. Neste caso não existe uma fonte de ionização, apenas a energia mecânica liberada pela explosão, que faz com que as partículas principalmente elétrons, ionizem o gás que está em seu entorno enquanto se expande. A Nebulosa do Carangueijo, produzida pela explosão de uma supernova que ocorreu em 1054, é um exemplo típico. O último tipo de nebulosa ionizada é representado pelas chamadas Nebulosas Planetárias. É o gás expulso por uma estrela antes de entrar na fase de anã branca, misturado com gás do MI. Anãs brancas são estrelas muito quentes, com temperaturas de superfície de cerca de 10.000 K (podendo chegar até 150.000 K) e portanto, produzem muitos fótons UV que excitam a nebulosa circundante. (O nome de planetária não tem nenhuma relação com planetas, simplesmente que as primeiras descobertas davam impressão de planeta gasoso como Júpiter.)

Distribuição da matéria
Agora que conhecemos os elementos de uma galáxia, nós queremos saber como eles são distribuídos. As galáxias são tipicamente formadas por três regiões distintas:
1  Núcleo
2  Disco
3  Halo

O Núcleo é a parte central de toda galáxia. Tem uma forma aproximadamente esférica e uma extensão de 10 a 20% do ráio da galáxia. Em geral é de cor avermelhada, indicando que está populado por gigantes vermelhas, estrelas velhas, também chamadas de População II pelo astrônomo alemão Walter Baade. Uma grande quantidade de poeira a torna mais vermelha ainda, ao absorver a luz azul e reemiti-la em frequências mais baixas. Estas nuvens de poeira impedem também que possamos ver com clareza o centro. Para podermos nos aproximar, devemos usar ondas de maior comprimento, por exemplo, infra vermelho, ou rádio. Técnicas rádio-astronômicas como Interferometria de Muito Longa Base (VLBI em inglês) e telescópios em órbita como o Spitzer ou o Herschel estão ajudando a conhecer estas regões escuras.

Em torno do núcleo está o Disco, que pode ter uma forma circular ou elíptica e sua espessura é muito inferior ao seu raio. Para se ter uma idéia: na Via Láctea, o disco tem uma largura de 2000 parsecs (baseada na distribuição de HI), enquanto o raio é superior a 20 mil parsecs. O disco de galáxias espirais muitas vezes tem um tom azulado, devido principalmente a estrelas jovens que estão em constante formação. Misturados com elas há nuvens de gás e pó de cor vermelha ou escura. Em galáxias espirais, com uma menor taxa de formação de estrelas, a coloração geralmente é avermelhada. Estrelas do Disco são muitas vezes chamadas de População I.

O halo de uma galáxia é composto de aglomerados de estrelas muito antigos, com distribuição esférica em uma área tão grande quanto o disco.

A julgar pelas observações de estrelas e gás neutro, a maior parte do material se concentra no núcleo de uma galáxia. Esta observação está em desacordo com as curvas de rotação galácticas. Como já mencionamos, o gás e as estrelas giram em torno de um centro comum. Sua dinâmica é regida pela lei da gravitação, e por isso é que nós esperamos o aumento da velocidade do centro até um determinado ponto e, em seguida, a diminuição. O aumento acontece porque o sistema gira como um sólido, com velocidade angular constante, consequentemente, sua velocidade tangencial é proporcional ao raio de giro
v = ω x R

onde v é a velocidade tangencial, ω a velocidade angular e R o raio. Um esquema da relação esperada é a seguir:
Esquema da relação esperada entre velocidade de rotação e distância ao núcleo se a matéria se encontra concentrada no centro.
A maioria das galáxias, entretanto, mostram uma relação bem diferente, tal como a do esquema abaixo. Duas interpretações podem ser consideradas: ou bem a teoria da gravitação não é completa (por exemplo, a escala galáctica existem outros termos), ou há coisas que não podemos ver, que não interagem com as ondas eletromagnéticas: a matéria escura. Por diferentes razões, admite-se que a solução está na matéria escura, diferente de tudo o que conhecemos, só podemos inferi-la e todas as suas características são desconhecidas para nós.
Esquema da relação esperada entre velocidade de rotação e distância ao núcleo observada na maioria das galáxias, incluindo a Via Láctea.


Um dos maiores mistérios das galáxias espirais é a origem de seus braços. Pela observação, sabemos que as galáxias devem ter completado mais de 100 giros desde sua formação. Isso deve criar braços 100 vezes "enrolados", o que contradiz a simples inspeção. O mistério foi resolvido nos anos 60 assumindo que os braços são ondas de densidade. A ideia é que o movimento elíptico não é uniforme, e a fase (ângulo) de cada elipse depende da distância ao centro. Um esquema pode ser visto na figura abaixo.
Esquema das ondas de densidade numa galáxia espiral. As regiões mais escuras (de maior densidade) é onde se forma um braço. (Wikipedia Commons)


Muitos astrônomos concluíram que no centro de muitas galáxias, incluindo a nossa, há Buracos Negros . Chegaram a esta conclusão pela observação do movimento do gás e das estrelas do ambiente. No entanto, precisamos desmistificar os buracos negros. Eles não são absorvedores de tudo, somente dentro do chamado raio de Schwarzschild toda a matéria e a luz é impedida de escapar. De forma abreviada, são uma singularidade matemática produto do colapso da matéria por causa da atração gravitacional. Todas as estrelas estão em um equilíbrio entre a atração gravitacional e a repulsão criada pela pressão termodinâmica. Quando esta última cede, há poucos mecanismos para impedir o colapso, alguns deles puramente quânticos como o Princípio de Exclusão de Pauli. No entanto, se essas derradeiras barreiras não forem suficientes, o buraco negro é formado. Muitas vezes, ocorrem depois de uma explosão de supernova. Nesses casos, a massa não é muito maior da que o do Sol. Porém, nos núcleos das galáxias formam-se buracos negros supermassivos com massas de milhões de sóis.

Galáxias de Núcleo Ativo (AGN)

Algumas galáxias têm uma emissão muito forte, muito maior do que as demais, em geral em freqüências não visíveis como o UV ou IV. Acreditamos hoje que elas têm um buraco negro supermassivo que gera um disco de acreção, que é responsável pela radiação observada. Estas galáxias são chamadas de forma geral de Galáxias de Núcleo Ativo abreviado por suas iniciais em inglês AGN (Active Galactic Nuclei). Membros desta classe são as Rádio Galáxias, as galáxias tipo Seyfert e BL-Lac e os Quasares, os mais famosos, assim chamados porque são quasi stellar objects (objetos quase estelares). O núcleo de uma AGN também tem um campo magnético muito intenso. A interação da matéria caindo no buraco negro e o campo magnético produz jatos de partículas perpendiculares ao disco de acreção (que é paralelo ao disco galáctico). Exemplos de AGN no quadro abaixo.


Núcleo de NGC4261, com o disco de acreção em torno do Buraco Negro
( STScI, NASA, Créditos para Leo Ferrarese)

Jato de partículas lançado pelo núcleo da Rádio Galáxia M87
( STScI)

Anel IV em torno do Quasar PG 1115+080. ( STScI, Crédito para Christopher D. Impey, University of Arizona)


A massa do buraco negro central de alguns quasares é da ordem de 109 M (massas solares), isto é, não muito diferente da massa de toda a Via Láctea, que por sua vez tem um modesto buraco negro de pouco mais de 106 M. Na verdade a Via Láctea está longe de ter características de AGN. Uma visão geral esquemática deste tipo particular de galáxias pode ser visto na figura abaixo. Hoje existe a idéia de que os AGN são objetos com as mesmas características, mudando apenas a orientação relativa a nós. Por exemplo, se o jato está apontando para a Terra, ou se vemos o disco de acreção de lado.


Esquema da região central de um AGN. No centro o buraco negro supermassivo. Em torno do mesmo, o disco de acreção. Perpendicular ao plano de acreção (que é também o plano do disco galáctico) vêem-se os jatos de partículas.


A Via Láctea
A galáxia na que se localiza o sistema solar, chamada Via Láctea, pode ser classificada como uma espiral com barra (Sb). Seu diâmetro é em torno de 30 kpc (quiloparsecs), enquanto que a espessura de seu disco é menor que 1 kpc. O núcleo da Galáxia é um elipsoide de aprox. 3,4 x 1,8 kpc. Por último o halo da Via Láctea possui em torno de 200 aglomerados globulares distribuídos esfericamente por fora do núcleo até os 50 kpc. As estrelas da Via Láctea são divididas en dois grupos, chamados de população I e população II. No primeiro caso trata-se de estrelas jovens formadas no disco e no núcleo galáticos. Estrelas de população II encontram-se principalmente nos aglomerados globulares do halo embora também nas entranhas do núcleo e são os objetos mais velhos da Galáxia, tão antiguos como a própria Via Láctea e o Universo. Interpreta-se que a formação estelar não cessou no disco nem no núcleo, por esse motivo encontramos estrelas jovens. O sistema solar localiza-se sobre o disco a uma distância de 8 kpc do centro galático no chamado braço de Órion. Demora mais de 200 milhões de anos em dar uma volta inteira em torno ao centro galático.


Concepção artística da Via Láctea com sua estrutura espiral, seus braços principais e a barra central. (Fonte: NASA/JPL-Caltech/R. Hurt, acesso em 28/08/2011)


O Centro Galáctico (CG) encontra-se na constelação de Sagitário. É difícil observá-lo com telescopios ópticos por causa da poeira e o gás que há em sua direção e que absorvem a maior parte da luz visível. Pode, no entanto, ser examinado por meio de ondas de rádio ou no infravermelho. Por meio destes comprimentos de onda aprendimos que existe uma fonte emissora bastante intensa batizada de Sgr A*. A medida que as observações foram aprimoradas pôde-se comprovar que a mesma é muito compacta e que a emissão vem de uma região de 15 UA (Unidades Astronômicas) de tamanho, semelhante com a órbita do planeta Saturno. Pôde-se determinar também que na região do CG há uma massa equivalente a 2,5 milhões de sois. A conclusão é que Sgr A* é um buraco negro, e o disco de acreção é a origem da intensa radiação observada. Embora nunca foi observado um jato do CG, no amo 2001, o satélite de observações em raios X Chandra, detectou uma explosão (ouburst em inglês) de uma duración de três horas.

A Via Láctea forma um sistema binário com a galáxia de Andrómeda, as masas de ambas são parecidas, e tem duas pequenas galáxias irregulares orbitando em torno de si, chamadas de Nuvens de Magalhães Maior e Menor.

Uma Bibliografia Básica

A seguir uma lista de livros e que foram consultados para escrever este capítulo.

Arp, H.,Quasars, Redshifts and Controversies, Interstellar media, Berkeley (EEUU), ISBN: 0941325008, (1987) Elmegreen, D. M.,Galaxies & Galatic Structure, Prentice Hall, New Jersey (EEUU), ISBN: 0137792328 (1998)
Osterbrock, D. E.,Astrophysics of Gaseous Nebulae and Active gacatic Nuclei, University Science Books, California (EUA), ISBN: 0935702229, (1989)





Guillermo Giménez de Castro, sob Licença Creative Commons. Última revisão: 28/08/2011


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Desenho e Arte: José Martín Torres e Guadalupe Torres.